O Homem-Polvo – Gregório José

O homem precisa ser como o polvo. Três corações para suportar as pressões da vida. Um para os que ama, outro para o que enfrenta, e o terceiro, escondido, para suportar quando se cala. Oito tentáculos — cada um com vontade própria, como se fossem versões suas, reagindo ao mundo de maneiras distintas. Porque viver exige isso: ser múltiplo, ser flexível, ser presença em mil lugares. O polvo é memória e adaptação.
Grava caminhos, reconhece rotas, abre potes, resolve enigmas, camufla-se no ambiente inóspito e, se tudo falha, solta tinta e desaparece.
Os homens também. Desde pequenos aprendem o jogo. Chegam à creche, inseguros, precisam se adaptar — ao novo, ao barulho, às regras. Criam vínculos, aprendem a conviver. Logo, mudam de escola, perdem os amigos, o chão, a rotina. E lá estão eles de novo, se refazendo, se ajustando, decorando caminhos, descobrindo como sobreviver. Em casa são um, na escola outro. Na casa dos avós — são até um pouco exagero. E assim vão sendo… tentáculos que se esticam em todas as direções, sentindo, buscando, aprendendo. Na adolescência, o corpo vira outro idioma. Se é menino, a voz vacila, o corpo cresce torto, os pelos surgem como sinais de que o tempo passou. Quer ser homem cedo, barba rala, músculos forçados, vontade de caber no molde que o mundo impõe. Se é menina, o corpo floresce de repente. Os seios crescem, a cintura afina, as bonecas dormem no fundo das caixas,
os cadernos se enchem de corações e segredos colados. O olhar muda — agora é espelho, agora é desejo. E como polvos, todos tentam se misturar. Camuflam sentimentos, soltam tintas para escapar de julgamentos, estendem tentáculos para buscar aceitação, amor, pertencimento. Vêm as bebidas, os cigarros, os vícios disfarçados de experiências. Tudo é tentativa de se encaixar. Como polvos no fundo do mar, nos tornamos mestres em sobreviver
em ambientes que não foram feitos pra nós. Porque, no fundo, ser humano é isso: ser bicho de muitas formas, de muitos jeitos, com muitos corações. E quando o mundo aperta, ou quando dói demais — a gente se recolhe em tinta e silêncio, e desaparece… só até se refazer.
O polvo vive por dois anos, Nós SERES “des”humanos Não podemos dizer, quando  Mas deixaremos a vida um dia, Talvez bem tarde, Talvez jovens, Então, vivamos como os polvos, Nos reciclando, até quando der!

Jornalista, radialista, filósofo

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